...Eu estou morrendo, sim, eu estou morrendo aos
poucos. Já não tenho mais aquela alegria de antigamente, aquele brilho no
olhar, aquela faísca. Todas aquelas coisas que desejei ao decorrer de minha
vida, foram colocadas em uma estante onde guardo as minhas decepções e não são
poucas. Eu não tenho nada, eu não sou nada. Eu não sei de nada, a não ser do
fato que eu estou morrendo e me afundando cada vez mais nesse abismo que habita
no canto mais escuro e profundo do meu ser. Eu não tenho ninguém, nem sei o que
é amor, o pouco que sei foi o que ouvi falar e coisas boas não eram, porque fez
aquela mulher que estava no ponto de ônibus chorar, ela contou-me toda a sua
vida, -como se já me conhecesse. Disse-me sobre o seu amor e como ele se
transformou em tragédia, apesar da minha vida inteira ser uma tragédia, eu não
quero isso para mim. Se bem que estou morrendo, então, que eu tenha uma morte
marcante, quem sabe assim eu seja lembrada. Continuo as minhas andanças por
dentro de mim, eu viajo o mundo todo sem sair do lugar, eu sou tão complexa,
olha, eu vou ser sincera a felicidade das pessoas me incomoda. Não é porque eu
não sou feliz que eu não quero alegria para a vida de outrem, mas estou em uma
fase tão ruim, aliás, minha vida toda é ruim. Sorrisos falsos, abraços falsos,
‘bom dia’ falso. Tudo falso, todos falsos. A vida é uma farsa. Descobri isso
tarde demais, ah, se eu soubesse disso antes... eu poderia ter sido diferente,
poderia ter ido morar em uma floresta e viver com animais, eles são tão
melhores do que as pessoas. Eu tenho nojo das pessoas, eu abomino as pessoas.
Pessoas hipócritas que fingem querer o seu bem, mas te querem isolados em um
canto qualquer e chorando até ter os olhos ressecados. Querem que você chore
sangue. Eu tentei desabafar por anos, no entanto, ninguém me ouvia, ninguém
quis me ouvir, meus gritos eram mudos e só eu podia ouvi-los e ainda ouço. Ouço
meus soluços repetindo uma melodia dramática todas as noites, vejo meus
pesadelos reprisando em minha mente toda vez que eu fecho os olhos. Eu não
tenho talento, eu não sirvo para nada, eu sou apenas uma aspirante à coisa
alguma, sem dom algum. Uma frustrada. Uma abandonada. Uma qualquer em um canto
qualquer e com pensamentos alheios a toda a realidade. Estou morrendo com a
consciência que não farei falta alguma. Eu enxergo coisas onde não tem ou todos
são cegos? Eu matei a mim
mesma, quando perdi a fé em mim, perdi a fé na vida, bebi o pior veneno de
todos, o meu. Eu não tenho nada, nada além da minha autodepreciação. Eu não sou
ninguém, eu sou apenas uma ilusão. Eu não existo.
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